Nestas vésperas de Natal, uma consideração que me vem à mente é a descrição que São Paulo fez do tempo que caracterizou a vinda do Messias, Nosso Senhor Jesus Cristo. O Apóstolo qualificou o tempo da vinda de Nosso Senhor como a plenitude dos tempos (Gálatas 4,4; Efésios 1,10).
Quando tive tempo para estudar, duas das minhas matérias preferidas eram a filosofia e a teologia da História, consideradas nas grandes linhas e planos gerais de Deus para a humanidade e para as épocas históricas. Muitas vezes, analisando algumas épocas do Antigo ou do Novo Testamento, perguntei-me qual teria sido o plano de Deus para este ou aquele povo ou civilização. E nas minhas hipóteses, imaginei que se os homens e as nações tivessem sido fiéis, o normal teria sido que os maiores potentados do mundo daquela época - o Imperador Romano, o Faraó do Egito, notáveis de várias Cidades-estados da Grécia, o Imperador da China, o Rei da Síria, etc. - ter aceitado e prestado homenagem ao nascimento de Cristo.
Com isso, a Encarnação do Verbo Divino teria ocorrido na plenitude dos tempos, porque todas as nações desta terra estariam maduras para recebê-Lo, glorificá-Lo e ser-Lhe totalmente fiéis. Esta foi minha primeira interpretação do que seria a plenitude do tempo.
Porém, quando ouço o ensinamento da Santa Igreja baseado nas Epístolas de São Paulo, devidamente inspiradas pelo Espírito Santo, a plenitude dos tempos tem um significado diferente. Nada, ou quase nada, do que eu imaginava aconteceu. O Império Romano era indiferente ao Deus verdadeiro e, embora estivesse na plenitude do seu poder político, já manifestava sintomas da decadência moral que levaria à sua destruição. Calígula e Nero já estavam florescendo sob Tibério. Restaram apenas pedaços da antiga glória humana do Faraó do Egito, e quanto à religião daquele país, reinou a mais crassa idolatria. A Grécia, outra antiga grande potência, foi transformada numa colônia romana. O Império da China caminhou por caminhos muito distantes da verdadeira religião. O Reino da Síria, ainda poderoso apenas 100 anos antes, também tinha sido subjugado pelos romanos. O próprio país judeu - um protetorado romano - era controlado pelo Rei Herodes, descendente de Esaú. Um paradoxo comovente: quando o Verbo se fez carne, um filho de Esaú reinou na terra de Jacó e na cidade de David.
Assim, minha imagem da plenitude dos tempos teve de ser corrigida. Tudo o que eu imaginava sobre os potentados temporais recebendo triunfalmente a vinda de Deus à terra foi reduzido à presença dos três Reis Magos do Oriente: pessoas cheias de encanto e poesia, como as oferendas que traziam, mas representando um pequeno poder temporal.
Em vez de serem recebidos com entusiasmo por parte do povo hebreu, São José e Nossa Senhora tiveram que viajar para Belém, onde não encontraram apoio. O Menino-Deus nasceu numa manjedoura para animais, porque ninguém daria um leito à Sua Mãe para que ela trouxesse à luz Aquele que é a Luz do mundo.
Quanto à religião judaica, em vez de se fazer uma preparação para receber Nosso Senhor, encontramos uma Sinagoga apóstata e corrupta, imersa, por um lado, nos rigores vesgos, nas intrigas malévolas e nas hipocrisias dos fariseus e, por outro, na acomodação ao mundo e ao materialismo dos saduceus.
Ao longo da História, nobres de toda a cristandade tiveram a honra de se colocar no papel dos Três Reis Magos. Aqui, os Príncipes Medici nesta função. O Convento de São Marcos em Florença
|
A fidelidade ainda estava presente em um pequeno resto. O profeta Simeão e São Zacarias, pai de São João Batista, ainda representavam o bom clero. A Profetisa Ana representava as religiosas que serviam no Templo. Os fiéis foram representados por São Joaquim, Santa Ana, Santa Isabel e outros cujos nomes não chegaram até nós, mas que certamente existiram. A fidelidade foi reduzida a um pequeno resto.
Portanto, num certo sentido, a plenitude dos tempos a que se refere São Paulo, era na verdade quase o oposto do que eu imaginava. Em vez do apogeu das instituições religiosas e temporais, o que existia era apostasia, decadência ou total indiferença a Deus. Em lugar da aceitação entusiástica do povo, vemos a sua rejeição.
Então, como explicar que, sem ser contraditório, o Apóstolo tenha usado a expressão plenitude dos tempos para se referir a esta época? Conheço duas aplicações para esta expressão: uma na ordem da teologia da História e outra na ordem moral.
Quanto à teologia da História, parece que a expressão significa que Deus deu aos homens, aos povos e às nações toda a graça que Ele planejou quando os criou. Agora, se as nações tivessem sido fiéis a essas graças, algo do que eu imaginava provavelmente teria acontecido. Mas as nações, em quase sua totalidade, foram infiéis. No entanto, aquele tempo de graça foi completo: a plenitude das graças foi dada e neste sentido foi alcançada a plenitude dos planos de Deus.
Na ordem moral, a presença de São José, o maior dos santos, e principalmente da Santíssima Virgem Maria, concebida sem pecado e Rainha de todos os santos, constituiu um ápice de santidade que mais apropriadamente pode ser qualificado como a plenitude dos tempos. Se é verdade que foram criados com a vocação de serem pais de Nosso Senhor, também é verdade que a santidade dos dois propiciou a Deus Pai para que Ele enviasse à terra o Seu Filho Unigênito.
Tem-se, então, um conceito qualitativo da expressão plenitude dos tempos que se refere ao tempo de Nosso Senhor. Embora quase tudo falasse de apostasia, decadência e indiferença, a existência de algumas poucas pessoas muito fiéis salvaria a raça humana e mereceria o maior elogio: elas mesmas, quase sozinhas, constituiriam a plenitude dos tempos.
Ora, se este princípio era verdadeiro na época da vinda de Nosso Senhor, por que não o seria em outros tempos?
Este pensamento me deu ânimo neste Advento e me fez compreender melhor a mensagem do Natal para os nossos dias. Com efeito, assistimos a uma profunda crise na Santa Igreja Católica, a uma grande indiferença a Deus por parte dos poderes temporais, a uma completa corrupção moral num mundo fiel em tempos passados a Nosso Senhor. Por que não deveríamos recorrer a Nossa Senhora e a São José e pedir-lhes que estejam presentes hoje também no remanescente que ainda tenta ser fiel? Então, por mérito deles e dos outros santos que nos precederam, e não por nossos próprios méritos, parece que vivemos na plenitude dos tempos. Uma era de graças está terminando para o homem e as nações, e outra era está começando.
Uma nova era de graças para a Igreja e para a humanidade virá para cumprir as palavras proféticas que a Virgem Santa pronunciou em Fátima: “Por fim o Meu Imaculado Coração triunfará!” Sem dúvida, este triunfo será o Reino de Maria, pelo qual espero e rezo para que possamos realizar os dois tipos de plenitude do tempo que aqui analisei: a plenitude qualitativa do tempo, na qual alguns poucos representam o gênero; e a outra, a quantitativa, onde todas as nações e potentados da terra se colocarão aos pés do Menino-Deus para glorificá-lo.
Neste Natal, rezo para que vocês e suas famílias meditem sobre isso, a fim de colherem as bênçãos e graças que Ele concede aos “homens de boa vontade” que buscam apenas a vontade de Deus.
|